Trabalhando na pintura Paisagem do Caraça, 2008


Marina Nazareth desenvolve ao longo dos últimos quarenta anos uma experiência contínua de criação. Acompanhar o seu roteiro é descortinar um mundo próprio e o resultado de longos anos de exercício expressivo.

Iniciando a sua atividade na primeira juventude, de 1962 a 1965, Marina Nazareth estudou desenho com Maria Helena Andrés, freqüentou o Curso de Belas Artes da UFMG onde entrou em contato com professores e colegas que influenciariam sua trajetória. Entre os professores, Álvaro Apocalypse, Haroldo Mattos e Yara Tupynambá, entre os colegas, Márcio Sampaio. Discípula de Fayga Ostrower; trabalha com a grande mestra e aprende conceitos e técnicas expressivas.

Neste período, produz desenhos e trabalhos em bico de pena.

Em 1969, dentro do contexto modernista de busca e experiência de novos modos expressivos, Marina Nazareth cria o “Concreto Cor”. A Artista colore o material característico da construção contemporânea – o concreto armado -, acrescenta ferragem, cortiça, cimento. Dele se apossa, pois soma a sua sensibilidade às formas produzidas ao dar relevo, cor, ritmo e equilíbrio e transformá-lo em objeto contemplável.

Em 1970, cria os “Fragmentos do Real” e trabalha a paisagem urbana filtrada pela memória.

As “Árvores” surgem a partir de 1976 com expressão da vida e promessas de desdobramentos.

Em 1978, Marina Nazareth trabalha com litografia e, em conjunto colegas – Lótus Lobo, Carlos Wolney, Tais Helt e George Helt – cria a Casa Litográfica e Ateliê Santo Antônio do Monte.

Em 1980, inicia uma nova série de pinturas denominada “Frutos da Terra”, gerados a partir das árvores e outras plantas, a exemplo da natureza.

Na “Poética da Cor”, que se inicia em 1982, Marina Nazareth brinca com a expressão. Na tela, as cores convivem lado a lado, sugerem, evocam, mas não retratam uma realidade definida.

Em 1988, Marina retoma o trabalho de litografia e cria, em sociedade com Thaís Helt e Thais Guimarães a Oficina Cinco, especializada em impressões litográficas.

Em 1990, Marina Nazareth relê “A construção da alegria” de Hélio Peregrino. A construção da alegria resulta da luta contínua envolvida no processo de sua produção. Mais do que o resultado final, a alegria realiza-se no esforço e na de sua busca. Pellegrino compara a construção da alegria à construção de um barco. O Autor manipulava a língua verbal e faz surgir o conteúdo através de figuras de linguagem, Marina lança mão de elementos visuais para construir configurações informais. A Artista desenha o próprio processo da criação da alegria.

A partir de 1993/95, “As Sombras e suas Flores” propõem a inversão da ordem causal. As telas de Marina Nazareth mostram-nos flores em cores magníficas acompanhadas de sombras que não reproduzem a sua forma. A arte e a imaginação recriam a realidade.

Marina Nazareth definiu o reflexo como “a sombra da luz”. A Artista caminha das sombras ao estudo do reflexo. As flores são agora emolduradas pelo reflexo no seu esplendor sobre a tela.

Em 2000, Marina Nazareth dedica-se aos “Gerânios”: a cor viva aplica-se à leve roupagem dessas flores, à percepção instantânea, à sensação de frescor, à apreensão sensorial anterior à organização racional.

Os gerânios apresentam-se também no Calendário de 2002, onde a artista correlaciona os Gerânios aos doze meses do ano e os associa a doze citações literárias. Esse calendário reúne três tipos de registros: as flores no espaço da pintura, o tempo medido em dias, meses e semanas no calendário, os excertos provenientes da leitura de autores diversos. A tela perpetua o breve encanto das flores, o calendário tenta apreender a fugacidade do tempo, a memória os alimenta com o gosto da poesia.

Em 2003, a Artista pinta a “Memória do Mar”. Mar é movimento, é ir e vir, é construir e destruir. É a própria expressão da vida e dos sentimentos cujo movimento contínuo nos condena a esquecer as nossas limitações. Nada mais real, nada mais imperceptível. O que vem e devém nada é ou é transformação ininterrupta.

Os “Retratos do Afeto” em 2004 atestam Marina Nazareth posta diante de si mesma. Janela e espelho: a pintora pinta personagens e seus retratos nos apresentam também a própria Artista. São “retratos dos afetos”; os fios condutores de carinho, amizade, convivência, aproximação, presença/ausência, falta, nostalgia, semelhanças/diferenças que compõem a trama da sensibilidade da artista. Ela inscreve na tela a sua biografia sentimental.

A partir de 2007, temos Marina Nazareth em sua fase atual, “Paisagem”. Montanhas sinuosas nos defrontam até o infinito; talvez tenham sido mar antes de emergir dele. O espaço nos sugere a percepção do infinito. Não há tela em que possam caber todas as paisagens, por isso é preciso acrescentar sempre outra tela até onde o olhar possa alcançar. O infinito está além do espaço, depois de ter esgotado todo espaço e tempo. Por isso, a cada quadro soma-se outro quadro até abranger todo o espaço possível.

Em sua obra como um todo, cada fase contém embrionariamente todas as outras fases. Matéria, forma, natureza, cultura, vivência individual e percepção do outro traduzem-se sob formas que coexistem sob outras formas aparentemente diversas.

Refletindo sobre a natureza da arte, em texto de 1969, Marina Nazareth declarou que “só na retrospectiva o caminho percorrido por um artista pode ser visto. Este caminhar se dá passo a passo e descoberta leva a descoberta: nasce do próprio trabalho”. Hoje, mais de quarenta anos após, a sua obra demonstra a verdade daquela afirmação.

Texto por Maria Eugênia Dias de Oliveira




Curriculum resumido – Marina Nazareth

Em atividade a partir de 1965, a artista ressalta em sua formação os estudos teóricos e práticos com Fayga Ostrower entre 1966 e 1970. Realizou mais de 30 exposições individuais no Brasil e exterior, destacando-se:

1969 – Reitoria da UFMG – Belo Horizonte
1974 – Museu de Arte Moderna do Paraná – Curitiba
1979 – Abreu Gallery – New York
1987 – Paço Imperial – Rio de Janeiro , MASP – São Paulo e Palácio das Artes – Belo Horizonte (Mostra itinerante )
1995 – Espaço Cultural dos Correios – Rio de Janeiro
2000 – BDMG Cultural - com o lançamento do livro “Marina Nazareth” de José de Anchieta Corrêa – Belo Horizonte
2001 – Museu Nacional de Belas Artes – Rio de Janeiro
2007 – Galeria Genesco Murta – Palácio das Artes – Belo Horizonte
2011 – Galeria Mari´Stella Tristão – com o lançamento do livro “Marina Nazareth- Fortuna Crítica” de Maria Eugênia Dias de Oliveira – Palácio das Artes – Belo Horizonte
2012 – Lançamento dos livros de artista “Instruções para voar” I,II,III,IV e V, com projeção do DVD das imagens – Sala Juvenal Dias- Palácio das Artes – “Sempre um Papo”
2013 – Sala Mário Silésio – Fundação de Educação Artística, com evento de leitura musical dos Desenhos “Partituras” – Belo Horizonte
2015 - Lançamento do DVD "O Sopro do Vento" - Cine Humberto Mauro, Palácio das Artes; Sala Mário Silésio, Fundação de Educação Artística; Escola Guignard - UEMG - Belo Horizonte;
2016 - "Linguagens em diálogo" arte visual, música, poesia - Sala de exposições temporárias do Museu Mineiro, Belo Horizonte.
A artista participou de inúmeros salões de arte nacionais e exposições coletivas: destaque para as pesquisas históricas de Marcio Sampaio sobre a Paisagem Mineira, o Desenho Mineiro e a Litografia Brasileira.

Obras em acervos públicos:

Museu Mineiro – BH
Museu de Arte de São Paulo – MASP
Museu de Arte Contemporânea do Paraná
Museu de Arte Contemporânea de Brasília
Centro Cultural dos Correios – RJ
Museu de Arte da Pampulha- BH
Fundação Clóvis Salgado – BH
Reitoria da UFMG, BH

Bibliografia:

Marina Nazareth – José de Anchieta Corrêa – Editora C/Arte, 1999 Belo Horizonte
Ateliê de Ofícios vol. 2 – Sylvio Coutinho e Moacyr Laterza , 2004 Belo Horizonte
Marina Nazareth / Fortuna Crítica – Maria Eugênia Dias de Oliveira, 2011 – Autêntica Editora, Belo Horizonte
Textos publicados em catálogos, revistas e jornais a partir de 1965 de diversos autores, entre eles, Amilcar de Castro, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos, Bartolomeu Campos de Queirós, Celma Alvim, Fábio Magalhães, Leonel Kaz, Márcio Sampaio, Miguel Gontijo, Moacyr Laterza, Roberto Pontual, Rubem Braga, Silviano Santiago, Walmir Ayala.

Ação cultural:

A partir de 1976 inicia, na recém criada Coordenadoria de Cultura do Estado de Minas Gerais um trabalho na área cultural, promovendo eventos como o Salão do Carnaval – (Palácio das Artes, 1980) ; exercendo curadorias como “Criação Erudita – Intervenções na trama urbana” no XII Salão Nacional de Arte (Museu da Pampulha)
Em 1981 coordena o setor de Artes Plásticas do XXIV Festival de Inverno da UFMG, em Diamantina. Trabalha na modificação da estrutura administrativa da Superintendência de Museus tendo sido a primeira diretora do Museu Mineiro.
Em 1996 coordena o projeto de pesquisa e exposição “Segredo de Estado”, realizado nas Galerias do Palácio das Artes, Museu Mineiro e Biblioteca Estadual. Entre 1998 e 2000 dirige o setor de Artes Plásticas do Palácio das Artes.
Atualmente está trabalhando na implantação de um Núcleo de Experimentação e Pesquisa para a Escola Guignard – UEMG.